MULHER

"Tive a sorte de, como seu colega, iniciar a minha carreira na docência e de com ela partilhar momentos afáveis, dialogantes e outros ásperos. Contudo nunca deixei de admirar a obra que ía produzindo, até colaborando na 'confecção' das estruturas de algumas das esculturas existentes na Escola onde mais anos leccionou - EB2/3 Álvaro Velho (Lavradio/Barreiro). Ainda antes que a 'mamy' voltasse a Albufeira, já pernoitava, no verão, na sua casinha de Albufeira e mais tarde na inacabada casa da Orada. Ricos serões desenvolvendo diversos temas, ideias, sonhos, saudades, política, injustiça, eu sei lá.

A sua morte deixa uma amargura, um vazio, um saudosismo. Ai aqueles 'rasgos' histéricos, por vezes sem aparente razão. Ai aquele odor.

Fica a memória de ter conhecido uma MULHER, com garra para a vida, raramente compreendida, uma artista, com quem aprendi tanto do ponto de vista técnico como pedagógico, que serviu para o meu apuro como educador, mas também como homem."

Octávio Rodrigues/Prof. EVT/EB2/3C de Álvaro Velho/Lavradio

Falha técnica


Em Outubro de 2010, doze anos após a 1ª entrevista, o documentário está pronto. No entanto, um problema técnico que não sei resolver impede que o vídeo seja exportado. Significa isto que o documentário não sai, ou seja, não cumpre a sua função de comunicação. Permanece em silêncio neste limbo ao qual só eu tenho acesso. 

Aprisionado no meu computador, o "Cântico das Sombras" espera por melhores dias.

Eu também.

Sombra de fogo




Quem é o Cavaleiro-Sol? E as flores que ele faz surgir no relvado miudinho? 

E que cântico é esse que provoca guerra, torna flor em pedra e dá eternidade a um amor misterioso?

Maria do Carmo do Coração de Jesus, Carmelita Descalça, é Madre Abadessa do Carmelo da Orada. É uma mulher diferente das mulheres da sua época. Uma mulher que lutará sempre contra a ignorância e a estupidez, contra os paradigmas, movida por uma paixão compreendida por poucos, por um amor fora do entendimento dos seres terrenos.

"... tam misterioso que em si mesmas timbravam esse novo mistério que só elas sabiam dizer."

Um poema de Amor


Entardecia. Na capela, mulheres veladas pelo silêncio soltavam as palavras nas suas mentes, fazendo borbulhar a água tépida onde repousava o seu deus.

Um ramo de flores decaía, tocado pelo calor estival, revelando a presença da morte. Lá fora, para lá das paredes grossas e das grades de ferro, acontecia o mundo e a vida. Também a morte. Mas não o silêncio.

Para as freiras, um dia era igual ao outro, com as mesmas rezas, os mesmos rituais, o mesmo deus no centro de tudo. Uma delas, no entanto, furava por vezes a cortina da monotonia. Nos bolsos do hábito escondia lápis e papel que utilizava para criar aquilo que o seu ventre não podia. Uma vida. Feita de palavras que, embora escritas, não ditas, não sussurradas, não gritadas, abanavam os contrafortes da montanha de silêncio de todos os dias.

"Só conheço um caminho todo rectidão
Por onde na terra ingressou a verdade
Luz da própria luz - em pálido clarão
Ou trevas no sentir da mesma claridade

Nas asas do desejo aqui na solidão
Posso fazer bem a toda a humanidade
Correr o mundo todo, em toda a direcção
Adentro dos umbrais da tua Caridade

Loucura ignorada de quem não sabe amar…
-Folha seca de Outono a esvoaçar –
Cântico singelo do nada ao Tudo, Senhor…

Fazer o Bem é no seio da tua igreja
O teu louvor, qual pássaro que adeja
É ver todos em ti e só viver de Amor."


Maria do Carmo do Coração de Jesus

Cântico das Sombras



Cântico. Vozes antigas, ecos moribundos, repetindo a mesma nota na melodia do impossível. Escuta, com paciência, e talvez a tua alma dance com o passado.

Sombras. Às vezes é preciso mergulhar nas sombras para delas extrair alguma luz. Descobrirás que é sempre a luz que vence.



Cântico de luz. Quando findar a tempestade, na quietude da terra molhada, na seiva da amendoeira, na placidez do firmamento, o estremecer de um sonho fará lembrar as velhas histórias. Alimenta-te delas. Floresce com o seu cântico de luz. E sonha também.