Um poema de Amor


Entardecia. Na capela, mulheres veladas pelo silêncio soltavam as palavras nas suas mentes, fazendo borbulhar a água tépida onde repousava o seu deus.

Um ramo de flores decaía, tocado pelo calor estival, revelando a presença da morte. Lá fora, para lá das paredes grossas e das grades de ferro, acontecia o mundo e a vida. Também a morte. Mas não o silêncio.

Para as freiras, um dia era igual ao outro, com as mesmas rezas, os mesmos rituais, o mesmo deus no centro de tudo. Uma delas, no entanto, furava por vezes a cortina da monotonia. Nos bolsos do hábito escondia lápis e papel que utilizava para criar aquilo que o seu ventre não podia. Uma vida. Feita de palavras que, embora escritas, não ditas, não sussurradas, não gritadas, abanavam os contrafortes da montanha de silêncio de todos os dias.

"Só conheço um caminho todo rectidão
Por onde na terra ingressou a verdade
Luz da própria luz - em pálido clarão
Ou trevas no sentir da mesma claridade

Nas asas do desejo aqui na solidão
Posso fazer bem a toda a humanidade
Correr o mundo todo, em toda a direcção
Adentro dos umbrais da tua Caridade

Loucura ignorada de quem não sabe amar…
-Folha seca de Outono a esvoaçar –
Cântico singelo do nada ao Tudo, Senhor…

Fazer o Bem é no seio da tua igreja
O teu louvor, qual pássaro que adeja
É ver todos em ti e só viver de Amor."


Maria do Carmo do Coração de Jesus